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Arquivo para abril 2011

De novo, os imigrantes

Rogério Simões | 12:35, quarta-feira, 27 abril 2011

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imigrantestunisiablog.jpgA lista da revista americana Time com as trouxe uma nova líder na qual poucos apostavam até recentemente. Seu avanço no círculo político, após a saída de cena do seu mentor e padrinho, foi uma das grandes novidades recentes na disputa pelo poder em seu país. Não estou falando da presidente Dilma Rousseff, também incluída pela Time na relação e cuja estrela só faz subir, apesar dos enormes desafios do Brasil. Eu me refiro à , cuja ascensão entre os eleitores na França é sinal dos tempos. Surfando na onda da crise econômica que continua afligindo o Velho Continente, um novo movimento anti-imigração ganha força entre líderes nacionais e apoio nas urnas ou pesquisas de opinião.

Os premiês da França e da Itália, depois de uma breve crise diplomática envolvendo imigrantes vindos da Tunísia, resolveram se aliar para combater o problema. Nicolas Sarkozy e Silvio Berlusconi apareceram nesta semana lado a lado para exigir da União Europeia uma revisão do acordo, nascido nos anos 80, que permite o livre trânsito dentro do bloco. É mais um baque para o espírito da UE, cujos principais pilares são a moeda única (abalada pelas crises na Grécia, na Irlanda e em Portugal) e a ausência de checagem de documentos nas fronteiras internas (com exceção das ilhas Grã-Bretanha e Irlanda). Desde a chegada de dezenas de milhares de refugiados das crises políticas no mundo árabe, a preocupação com a imigração aumentou, e as lideranças nacionais sentem-se pressionadas a fazer algo a respeito. Na cabeça de Sarkozy, particularmente, está o nome de Marine Le Pen. A filha de Jean-Marie Le Pen herdou do pai o comando do partido de extrema-direita francês e vem tentando torná-lo uma opção viável nas urnas. Uma pesquisa recente trouxe Marine na liderança da disputa presidencial, um ano antes das próximas eleições, com o apoio de 23% dos ouvidos. Foi o suficiente para preocupar Sarkozy, que deverá tentar a reeleição, e colocá-la na lista de influentes da Time.

O apoio a políticos que exploram o medo da população local de perder o emprego para trabalhadores estrangeiros não se restringe à França. Vários países europeus registraram nos últimos anos um crescimento dessa tendência, como a Finlândia, onde a extrema-direita quadruplicou seus votos entre 2007 e 2011, chegando a 20% do total no pleito realizado em março. Além disso, a preocupação geral com a imigração (ou com os fantasmas criados em torno do fenômeno) tem forçado políticos mais ao centro a ajustar seus discursos. O atual líder dos trabalhistas na Grã-Bretanha, Ed Milliband, disse dias atrás que o seu partido, quando no governo, subestimou o impacto da imigração na disputa por empregos e moradia no país. O atual primeiro-ministro, o conservador David Cameron, foi além: comprometeu-se com mais restrições contra aquilo que chamou de "imigração em massa".

A atração exercida por muitos anos pelo continente europeu sobre aspirantes a bons empregos e bons serviços sociais tem diminuído desde a eclosão da crise econômica, em 2008. Nações como Irlanda e Portugal, que por muitos anos atraíram trabalhadores de várias partes do mundo, inclusive do Brasil, começam a voltar à característica que tiveram no passado, de exportadores de mão-de-obra. Portugueses céticos diante das atuais dificuldades começam a deixar o país, numa onda migratória que tem como um dos destinos o Brasil. Já os brasileiros em geral começam a se acostumar, cada vez mais, com a presença de latino-americanos, europeus ou americanos no mercado de trabalho, já que o crescimento econômico tem atraído profissionais, qualificados ou não, de outras nações. O Brasil, cuja sociedade é majoritariamente composta por imigrantes (os índios são os únicos que estão no país há mais de 500 anos), perdeu cidadãos durante décadas, mas volta a receber estrangeiros entusiasmados com seu potencial. Qual será a atitude do país diante desse interesse? Parte dos europeus acredita não poder mais manter suas portas abertas, levando líderes a jogar com as cartas da xenofobia. No Brasil, a disposição de lidar com o diferente também será aos poucos testada, pelo menos enquanto o país for visto como fonte de prosperidade em um mundo imerso na incerteza econômica.

A luta por energia

Rogério Simões | 17:02, segunda-feira, 18 abril 2011

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nuclearblog.jpgO filme , de 1981, dirigido pelo francês Jean-Jacque Annaud, conta uma história passada nos primórdios da humanidade. Neandertais e homo sapiens disputam território e recursos, em uma interação decidida pela capacidade do humano moderno de produzir e controlar o fogo. Tal habilidade viria a definir a conquista da Terra pela humanidade. Há mais de 100 mil anos o homem manipula a natureza para a fabricação de energia, essencial para protegê-lo do frio, cozinhar alimentos e garantir sua segurança em meio à escuridão.

A chegada da eletricidade à vida cotidiana revolucionou nossas sociedades e aumentou drasticamente nossa dependência de energia. Nossa segurança e visibilidade noturnas passaram a ser garantidas não mais pelo fogo, mas por fios de conexão e sistemas de distribuição de eletricidade, cuja geração passou a ser feita das mais diversas formas. Hoje sabemos que as mais tradicionais são nocivas ao meio ambiente. O relativo consenso que se formou em torno da principal causa do aquecimento global, a emissão de gás carbônico na atmosfera, transformou em vilã quase toda produção de energia, praticamente associando a vida em centros urbanos à inevitável destruição do nosso habitat natural. Até mesmo a operação hidrelétrica, não associada diretamente à emissão de carbono e considerada limpa a partir do início da produção energética, tem enorme impacto sobre comunidades e a natureza na sua fase de implantação. Produzir e consumir energia são atividades hoje tão perigosas ao planeta quanto essenciais à nossa vida moderna.

O assunto tornou-se mais complexo após o terremoto e tsunami no Japão, no mês passado. O acidente na usina nuclear de Fukushima foi de repercussões atômicas no debate sobre a validade e os riscos dessa matriz energética, considerada por muitos uma alternativa essencial no combate ao aquecimento global. Em comparação a qualquer outra produção de energia fóssil (carvão, petróleo, gás natural), ela é relativamente limpa, mas envolve o risco de vazamento de radiação e a inevitável produção de lixo radiativo. Isso já se sabia, mas o acidente de Fukushima deu novas cores à polêmica. Na Europa, a reação imediata foi o anúncio de novos testes de segurança nas instalações nucleares no continente. Apesar das promessas do governo alemão de rever a decisão de aumentar a vida útil de suas usinas, milhares de pessoas protestaram em Berlim contra a produção de energia nuclear no país. A preocupação dos alemães foi tanta que o apoio ao Partido Verde local disparou, dando à legenda uma histórica vitória nas eleições do Estado de Baden-Wurttemberg, uma derrota amarga para a chanceler Angela Merkel. Do ponto de vista de grande parte da Europa, a tragédia japonesa enfraqueceu o argumento em favor da energia nuclear.

Muitos, entretanto, não se cansam de repetir o que para outros é uma tese difícil de aceitar: o aquecimento global não poderá ser contido ou mesmo minimizado sem a ajuda da energia nuclear. Um dos que abraçaram essa linha de raciocínio foi o jornalista/ativista britânico, e conhecido defensor do meio ambiente, George Monbiot. Após o desastre de Fukushima, Monbiot da destruição causada pelos combustíveis fósseis, após se convencer de que os danos à saúde causados pela radiação são menores do que se pensava. Sua posição, no entanto, está longe de ser unânime, tendo provocado a ira de ativistas que há décadas luta para expor o que considera perigos da radiação. No embate que os dois travam nas páginas do jornal The Guardian, Caldicott diz que Monbiot distorce evidências sobre os riscos da energia atômica, enquanto o jornalista argumenta que abandonar essa opção resultaria em um desastroso agravamento do aquecimento global.

A empresa que opera o complexo de Fukushima prometeu controlar o vazamento radioativo até o final do ano, dias depois de o acidente ter sido elevado ao mesmo nível de gravidade do de Chernobyl. Se essa previsão de confirmar, é bem possível que o grau de preocupação com acidentes nucleares volte ao mesmo padrão anterior ao devastador terremoto japonês. A conscientização sobre os riscos para a humanidade do aquecimento global (desertificação de enormes áreas, inundações etc) pode manter viva a opção da energia nuclear. Mas o medo de um inimigo invisível, cujos rastros de danos podem durar por décadas ou gerações, deve garantir uma significativa oposição à opção radiativa. O ser humano não quer voltar aos tempos em que calor e proteção eram obtidos apenas por meio de peles de animais e tochas, e espera-se que mais prioridade seja dada às fontes renováveis e de menor prejuízo à natureza e à saúde da população. Mas a luta da humanidade em busca de energia continuará, e grande parte da sua produção seguirá, por um bom tempo, causando danos à vida na Terra. Continuaremos pagando um preço alto pelas conquistas da vida moderna.

China, nação vencedora

Rogério Simões | 15:06, quinta-feira, 7 abril 2011

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chinablog.jpgA Guerra Fria acabou há 20 anos. Em 1991, a linha-dura soviética, ciente de comandar um império moribundo, tentou impedir o inevitável. Primeiro, com uma última invasão dos países bálticos e meses depois, em agosto do mesmo ano, com o fracassado golpe contra Mikhail Gorbachev. Em poucos meses, entretanto, ficou claro que o conflito entre Ocidente e Oriente chegara ao fim. A Rússia não apenas via seu império ruir, mas experimentaria anos depois um colapso econômico e a proliferação de movimentos separatistas no Cáucaso, acompanhados de guerras e ações terroristas. A entrada em cena do quase czar Vladimir Putin, na virada do milênio, recuperou parte do orgulho nacional. Mas, quando o assunto é Guerra Fria, não há dúvidas: os russos perderam.

Mas quem realmente venceu? Os registros históricos dos últimos 20 anos dão a vitória aos Estados Unidos, ou ao chamado Ocidente. Líderes como Ronald Reagan, Margaret Thatcher e Helmut Kohl saíram do conflito com medalhas de ouro no peito. Duas décadas depois, entretanto, tal vitória parece mais discutível, e um nome alternativo começa a colher dividendos mais permanentes do fim da Guerra Fria. Nos anos 80, enquanto americanos e russos ainda se degladiavam, os chineses absorviam o capitalismo na sua economia, mantendo a política centralizada, sob controle comunista. O que aconteceu todos sabemos: a República Popular da China correu por fora, dominando o comércio mundial e aumentando ano a ano sua influência internacional. Os chineses seguem rumo à posição de superpotência econômica e política, em um mundo que ainda especula sobre como Pequim exercerá esse papel.

Na década de 90, a Guerra Fria deu lugar ao otimismo. Para muitos, ela seria seguida de um novo século marcado pela supremacia de um modelo político-econômico específico: a democracia liberal. O dinheiro seguiria livremente pelas amplas estradas do capitalismo financeiro, promovendo competição e prosperidade, enquanto as elites políticas seriam compostas por meio do voto popular. O movimento de estudantes por reformas democráticas em 1989, em Pequim, sufocado com o que ficou conhecido como o massacre da Praça da Paz Celestial, reforçou a equivocada impressão de que liberalismo econômico e democracia seriam as regras em uma era que chegou a ser chamada pelo americano Francis Fukuyama de "fim da história". É verdade que os valores democráticos ganharam força recentemente, com as seguidas rebeliões no mundo árabe. Mas poucos vislumbram grandes mudanças políticas na ditadura chinesa num futuro próximo. Ou na Rússia, que adotou uma versão de democracia no mínimo peculiar, construída em torno do homem-forte e hoje primeiro-ministro do país, Vladimir Putin. Sobre o liberalismo econômico, sua versão fundamentalista, que reinou por 30 anos, desmoronou em 2008. A ideia do Estado como importante ator econômico ganhou força, e o fato de que a China manda cada vez mais nos rumos da economia global é um atestado de quão precipitada era a previsão de que a iniciativa privada dominaria o planeta. O capitalismo chinês, afinal, segue marcado por grandes empresas estatais e a autoridade do Partido Comunista.

Como muitos dos dividendos esperados pelo Ocidente, após o fim a longa guerra contra os soviéticos, não se confirmaram, é possível argumentar que a avassaladora vitória liberal foi temporária. Vinte anos depois do colapso soviético, a China parece ter mais condições de cantar vitória em um conflito no qual era apenas coadjuvante. Como mostram as reportagens de Silvia Salek publicadas aqui na ´óÏó´«Ã½ Brasil, os chineses, queiram ou não, já se preparam para ocupar um posto de liderança internacional ao lado dos Estados Unidos, ameaçando, inclusive, a hegemonia americana em muitas áreas. O Brasil, cujos poder e influência também aumentaram significativamente nos úlitmos anos, sabe que os chineses são hoje praticamente tão importantes quanto os americanos nas relações internacionais. Dilma Rousseff recebeu Barack Obama recentemente e estará na China para a reunião dos BRICs. Após poucos meses no Planalto, a presidente já terá dialogado diretamente com as duas maiores forças do mundo atual: aquela que riu sozinha por muitos anos e a que pode acabar rindo melhor.

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