De Kyoto a Montreal, via Cancún
Fez 23 anos, na semana passada, o Protocolo de Montreal. Hoje, talvez pouca gente se lembre dele, mas na década de 80, falava-se do buraco na camada de ozônio sobre o Pólo Sul como hoje se fala de mudanças climáticas.
Era um desafio imenso. E uma ameaça.
Praticamente todos os aerossóis e vários produtos usavam os chamados gases CFCs (clorofluorcarbonos), que destroem o ozônio na atmosfera. Como resultado, cientistas descobriram que esse filtro fundamental para a saúde do planeta - particularmente a nossa - estava desaparecendo.
Nos paÃses em desenvolvimento, as obrigações introduzidas pelo Protocolo de Montreal foram acompanhadas de financiamentos e outros mecanismos de apoio financeiros bancados pelos paÃses ricos. Lembra Kyoto, não?
Bem, as semelhanças com as mudança climáticas acabam por aÃ.
Processo lento e gradual
O resultado, segundo a ONU, é uma redução de 97 % no potencial de destruição do ozônio.
Pouco mais de duas décadas mais tarde, cientistas constatam a recuperação lenta e gradual da camada de ozônio. No caso do protocolo de Kyoto, um punhado dos paÃses signatários atingiu as metas obrigatórias.
Como no caso do clima, o processo é muito lento: cientistas calculam que a camada de ozônio só deve voltar aos nÃveis originais por volta do ano 2500, embora ele possa começar a diminuir em 10 a 15 anos. E o aquecimento global é um fator que atrapalha a regeneração.
O que nos traz de volta ao desafio atual: um tratado sobre mudanças climáticas.
Entre 29 de novembro e 10 de dezembro, acontece mais uma rodada de negociações sobre o clima, dessa vez em Cancún, no México - a primeira após o alardeado fracasso de Copenhague, em 2009.
Mas, se as mudanças climáticas são uma ameaça muito mais dramática que o buraco da camada de ozônio, por que Montreal deu certo e Copenhague (alguns dizem Kyoto) afundou?
Existem mil respostas. Para ficar nas mais tangÃveis, um protocolo sobre o clima envolve muito mais setores do que um sobre CFCs. Envolve também mudanças profundas na cadeia de produção: CO2 é produzido por virtualmente toda a indústria. E envolve muito, mas muito dinheiro.
Principais economias em reunião
Nesta terça-feira, lÃderes dos 17 paÃses responsáveis por 80% da poluição do planeta, o chamado grupo das grandes economias, concluem em Nova York mais uma reunião de cúpula para tentar aparar arestas e chegar a um consenso para liberar verbas já prometidas aos paÃses mais pobres e preparar novas propostas que possibilitem um acordo em Cancún.
Ninguém espera grandes avanços. A crise ainda ronda os paÃses mais ricos, o ceticismo - que contraria a grande maioria dos estudos cientÃficos - parece ter ganhado força e um dos principais atores do processo, os Estados Unidos, continuam atolados no meio do caminho que poderia levar a um futuro com baixas emissões de carbono.
Outras reuniões preparatórias estão marcadas para antes de Cancún. A esta altura do ano passado, vésperas de Copenhague, a pressão da opinião pública era enorme, mas já havia indÃcios do naufrágio adiante.
Neste ano, a situação se inverteu: ninguém espera avanços e a pressão é bem menor. Será que só a publicação do novo relatório do Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), previsto para 2013-14, vai dar fôlego às negociações?