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Bibliotecas públicas e a voz da comunidade

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Daniel Gallas | 2009-12-11, 12:02

Esses dias eu percebi que um hábito de consumo meu mudou muito desde que me mudei para Londres. Eu praticamente parei de comprar livros aqui. Neste ano, só comprei dois livros.

library226.jpgNo entanto, 2009 foi um ano em que li vários livros - de clássicos a lançamentos recentes. O motivo disso são as excelentes bibliotecas públicas de Londres. É difícil achar defeitos nas bibliotecas daqui. Os catálogos são atualizadíssimos, quase sempre com várias cópias dos últimos lançamentos do mercado. Os prazos são flexíveis (três semanas por livro), com multas baixas e possibilidade de renovação pela internet.

Caso você não encontre um livro na sua biblioteca, mas que está disponível em outra do mesmo bairro, é possível encomendá-lo via internet para que ele seja retirado na biblioteca mais próxima da sua casa. Eu, que moro na fronteira de dois bairros de Londres - Lambeth e Southwark -, ainda tenho a vantagem de poder explorar os catálogos dos dois bairros.

Isso sem falar no vasto catálogo de CDs e DVDs, que são alugados a baixos preços. Isso explica por que há tão poucas locadoras de filmes em Londres. É impossível competir com a biblioteca pública.

Além disso, as bibliotecas se esforçam para unir pessoas de interesses comuns na comunidade. Há mais de um ano, minha esposa e eu estamos frequentando um grupo de leitores de quadrinhos. Nunca fui um grande fã das "graphic novels", mas confesso que graças ao grupo conheci vários quadrinhos com qualidade superior a de muitos livros da literatura clássica, como a série Love & Rockets, dos irmãos Hernandez.

Pois foi frequentando o grupo de quadrinhos que tive uma inusitada experiência de participação política nas decisões da comunidade daqui.

Há dois meses, os administradores das bibliotecas de Lambeth decidiram encerrar as atividades do grupo de quadrinhos do qual eu participo. Na visão deles, não havia necessidade de pagar hora extra para o funcionário que organizava os encontros. As reuniões acontecem uma vez por mês à²õ 19h30, o único horário possível para quem trabalha durante o dia.

Nós não aceitamos uma possível troca de horário e o funcionário disse que, nesse caso, não havia nada que ele pudesse fazer para salvar o grupo, que teria de ser encerrado. Mas ele sugeriu que nós, os usuários do serviço, poderíamos enviar cartas e e-mails para protestar contra a decisão.

Depois de três e-mails enviados, a biblioteca recuou da decisão e optou por continuar com o encontro no horário marcado, arcando com os custos de se manter as reuniões naquele horário.

Ficamos contentes com a decisão, porque o grupo faz um trabalho de alta qualidade ao longo dos últimos quatro anos e com grande participação de pessoas da comunidade. Com ajuda de outros grupos de quadrinhos de Londres, já recebemos a visita de ilustradores famosos, como Kevin O'Neill, da Liga de Cavalheiros Extraordinários, e D'Israeli, de Scarlet Traces.

Fiquei pensando que algumas experiências da Grã-Bretanha eu gostaria muito de poder exportar para o Brasil. Uma delas é o acesso gratuito ou com baixo preço a livros, discos e filmes para todos - tudo com dinheiro público. A outra é a de ter a minha voz ouvida nas decisões da comunidade, por menores e mais irrelevantes que elas possam parecer para os demais.

°ä´Ç³¾±ð²Ô³Ùá°ù¾±´Ç²õDeixe seu comentário

  • 1. à²õ 01:58 PM em 11 dez 2009, Ana Carla Pereira escreveu:


    É a diferença de mundos. Quando falo no Brasil que somos um país de 3° mundo, as pessoas quase me batem. Mas está aí um exemplo simples da diferença entre os dois países.

  • 2. à²õ 04:02 PM em 11 dez 2009, Marcos Maurilio escreveu:

    Realmente isso é incrível!

    Sou bibliotecário, e sei que ainda falta muito pra nós brasileiros chegarmos a este patamar de nossa cultura.

    Nossas bibliotecas públicas funcionam, as vezes, em condições precárias. Isso sem falar nas condições do acervo (considerando tamanho, preservação, atualização, etc.).

    Mas esse não são os únicos problemas. Precisamos mudar nossos hábitos individuais. Diariamente surgem notícias como: "os brasileiros lêem apenas 2 livros por ano", "o Brasil tem 40% dos municípios sem biblioteca", etc. etc. etc.

    Precisamos de insentivo público, sim!!!
    Mas, antes de tudo, precisamos mostrar a nossos líderes que queremos e que saberemos utilizar os recursos públicos que disponibilizarem.

  • 3. à²õ 10:39 PM em 12 dez 2009, WANDERLEY STAGLIANO escreveu:

    O que falta no Brasil e vontade polica e uma cultura que leva ao habito da leitura, morei por alguns anos em Rio Verde - Goias e numa das cidades que mais crescem no interior do Brasil nao existia uma Biblioteca descente. A Biblioteca do Municipio funcionava num predio pequeno e os livros estavam doentes - a local era insalubre para os leitores e funcionarios. Em Londres e nas cidades do interior da Inglaterra tive acesso a Bibliotecas Publicas de qualidade - interessante - que elas tem diferentes tamanhos e usam diferentes espacos. Nao e nada impossivel existir Bibliotecas como as daqui no Brasil basta vontade politica.

  • 4. à²õ 04:07 AM em 13 dez 2009, ³Õ±ð°ùô²Ô¾±³¦²¹ escreveu:

    O último parágrafo diz tudo quero dizer,seria um sonho que houvesse um serviço público como esse aqui no Brasil.Maravilhoso,meus olhos brilham,mesmo me dando tristeza por ser algo tão distante da nossa/minha realidade.

  • 5. à²õ 02:59 PM em 14 mai 2010, hime escreveu:

    Um bibliotecário escrevendo "insentivo"? meu Deus, eu tb sou bibliotecária! Isso foi tão feio quanto um professor escrever errado (com o que u vi na universidade, parece que tal situação não está longe)
    Com certeza que os hábitos de leitura precisam mudar no Brasil...o outro me escreve descente...

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