Como filha de médico, sempre tive acesso a uma medicina cinco estrelas no Brasil.
Depois de 15 anos vivendo na Grã-Bretanha, ainda me choco com o nÃvel baixo da medicina oferecida nos postos de saúde - seu primeiro ponto de parada quando você tem qualquer problema médico que não seja uma emergência - daqui.
Nessas clÃnicas, você é visto por um clÃnico geral, ou GP, sigla inglesa para General Practitioner. A escolha das clÃnicas é determinada pelo bairro onde você mora. Quem tem sorte de morar perto de um posto de saúde onde há bons médicos, recebe um atendimento melhor.
Claro que existe um componente social aÃ: a probabilidade de você ser visto por um GP melhor aumenta se você mora em bairros mais afluentes. (Isso é teoria minha, podem me contradizer se acharem que estou enganada).
Na minha experiência, o GP, em um paÃs onde a medicina é pública (não sei por quanto tempo isso ainda vai durar), funciona como um filtro que impede que você vá ao especialista. A idéia é que ele atenda a quem realmente precise. Além disso, quando você vai ao especialista, o governo gasta mais. Então, na prática, o que eu tenho vivenciado é que o GP evita que eu veja um médico especializado mas por outro lado não resolve meu problema. Ele vai receitando um remédio aqui, outro ali, e só me indica ao especialista se a coisa está mesmo muito brava.
Claro que nesse processo quem sofre é o paciente. Digamos que eu tenha um probleminha de pele. Aquilo não oferece risco sério para a minha saúde, mas pode causar extremo desconforto. Provavelmente vou ficar meses sofrendo com aquilo, porque o GP não vai me mandar para o dermatologista até a coisa ficar intolerável.
Talvez existam aà outros fatores.
O nÃvel da formação oferecida aos médicos caiu muito (aliás, não só na Grã-Bretanha). É possÃvel que o clÃnico geral à antiga fosse capaz de diagnosticar e tratar coisas que os GPs de hoje, menos preparados, não conseguem. Além disso, o Sistema Nacional de Saúde britânico, o NHS, na sigla inglesa, está passando por uma crise terrÃvel e os médicos estão desmotivados.
Enfim, contei toda essa história para chegar a um caso feliz.
Uma grande amiga passou por uma gravidez dificÃlima. Ela tem 42 anos e estava esperando gêmeos. Por causa da idade, ela acabou conseguindo passar na malha fina e foi vista por um especialista fera, que identificou um problema sério com os bebês.
Resultado, sem pagar nada mais do que as contribuições mensais que todo cidadão britânico faz para o sistema de saúde, minha amiga foi operada no quinto mês de gravidez. Os médicos operaram os gêmeos dentro da barriga dela. A técnica é bastante moderna, só existe há cinco anos.
Depois da cirurgia, ela foi acompanhada com ultrassons semanais.
No sétimo mês, foi feita uma cesariana. Havia 13 pessoas na equipe que fez a cirurgia. Agora, os gêmeos estão em uma encubadora. Vão ficar lá por pelo menos seis semanas.
Imagine o custo de um tratamento como esse. E quem está bancando tudo é o NHS. No Brasil, talvez só sendo rico, filho de médico (e olhe lá…) ou tendo um bom plano de saúde.