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Ousadia e sofrimento no Haiti

Rogério Simões | 2010-01-14, 12:38

haitiblog.jpgÉ difícil dizer ao certo quando começou o sofrimento do Haiti. Talvez em 1492, quando Cristóvão Colombo desembarcou na ilha Hispaniola e deu o pontapé inicial a séculos de colonialismo, exploração e interferência internacional. Também pode-se apontar o ano de 1697, quando França e Espanha dividiram a ilha, entre o que se tornariam Haiti e República Dominicana, como parte de um acordo para acomodar seus interesses. Outros ainda podem dizer que tal sofrimento começou mesmo em 1804, quando os escravos negros, então dominados pelos franceses, ousaram declarar sua independência política, um feito único no mundo. Nos rostos de cada vítima do devastador terremoto desta semana, parece haver um pouco dessa história, marcada pela exploração, externa e interna, de um povo hoje atolado na pobreza absoluta.

Muitos países usaram o Haiti para interesses próprios desde a chegada de Colombo, particularmente Espanha, França e Estados Unidos. A Espanha lançou a moda com o uso dos nativos para a extração de recursos naturais, mas posteriormente abandonou o território. Os franceses, mesmo após dois séculos de exploração colonial, exigiram dos haitianos um pagamento de indenização bilionária, décadas depois de sua independência, como exigência para reconhecê-la. Os Estados Unidos invadiram o país em 1915, mantendo suas tropas até 1934.

Após o fim da sangrenta dinastia dos Duvalier (Papa Doc, Baby Doc e seus capangas Tonton Macoutes), que dominou o país dos anos 50 aos 80, a interferência internacional mudou um pouco de estilo. Em 1994, a Casa Branca de Bill Clinton recolocou o presidente democraticamente eleito Jean-Bertrand Aristide na Presidência, numa ação de apoio à vítima de um golpe militar. Dez anos depois, entretanto, a Casa Branca de George W. Bush retirou o mesmo Aristide do país e o levou para o exílio, numa manobra mal explicada até hoje. O presidente deposto alegou ter sido sequestrado, mas Washington disse que ele pediu para sair. , um ano depois, que Aristide atribui sua queda à sua recusa a atender à²õ demandas dos Estados Unidos para privatizar o Estado haitiano. O mesmo Aristide, pouco antes do abrupto fim do seu último governo, peitou outra potência internacional, ao exigir da França bilhões de dólares como indenização por aquele pagamento forçado no século 19, logo após a independência haitiana. A França não gostou e só permitiu que o Conselho de Segurança da ONU aprovasse ajuda militar ao Haiti depois da saída do presidente.

Foi quando o Brasil entrou na história, chefiando a força de ajuda das Nações Unidas que está no país desde 2004. Na semana passada, após seis anos com a presença da bandeira azul da ONU, o Haiti continuava uma nação paupérrima, que mal funcionava, mas que pelo menos contava com órgãos de governo, um Parlamento, força policial. Após o terremoto, com a destruição completa da capital, Porto Príncipe, nem isso existe mais. A nação de escravos negros rebeldes nasceu de uma ousadia contra o poder colonial e parece já ter pagado bastante caro por isso, com exploração financeira, invasões, ditaduras e golpes. Quando parecia que o Haiti não tinha mais nada a perder, a natureza testa de vez sua resistência, e o mundo (Estados Unidos, Brasil, França e muitos outros) é chamado para ajudá-lo. Sozinho, o Haiti dificilmente sobreviverá.

°ä´Ç³¾±ð²Ô³Ùá°ù¾±´Ç²õDeixe seu comentário

  • 1. à²õ 04:19 PM em 14 jan 2010, Alex Fabiani escreveu:

    "Existem duas ou três estórias sobre a humanidade, e elas se repetem ao longo do tempo com fervor, como se nunca houvessem ocorrido antes." (Willa Cather)
    Acima, um resumo do que eu acho sobre a exploração do Haiti por outros povos.
    Quanto ao terremoto, é por um lado um grande sofrimento para o povo de lá, e é uma excelente oportunidade para o resto da tal "humanidade" tentar se redimir e ajudar ao próximo.
    Uma hora de vôo de um avião militar na guerra = US$ 50 mil (aproximadamente). Isso já dá pra construir uma escola.

  • 2. à²õ 07:20 PM em 14 jan 2010, Victor escreveu:

    No caso do "seqüestro" de Aristide pelos Estados Unidos, é bom lembrar que depois de ter sido reempossado em 1994, ele extinguiu as forças armadas que haviam lhe aplicado um golpe militar anos antes. Além disso, tratou de armar sua milícia particular, prática recorrente na história do país. Com isso, tornou desempregados um bando de militares armados e estimulou um clima de guerra. Isso, somado a outros problemas sociais e econômicos, levou à convulsão social de 2004 que tirou Aristide do poder novamente. Deve ser verdade que Bush o seqüestrou. Mas também é verdade que seu governo já estava fadado ao fracasso, em grande parte por culpa do próprio Aristide.

  • 3. à²õ 01:21 PM em 15 jan 2010, Harris Pohl escreveu:

    Victor voce esta bem mal informado. Voce precisa deixar a propaganda de lado e se aprofundar no assunto. Voce sabia que os EUA, e Canada apoiaram o governo corrupto, opressor e destruidor da sociedade civil no Haiti?



    Canada in Haiti: Waging War on the Poor Majority by Anthony Fenton and Yves Engler (Paperback - April 1 2006)

    Hideous Dream: Special Operations, Racism, and Imperialism in the Haiti Invasion of 1994 by Stan Goff (Paperback - Jan 31 2001)
    Os militares brasileiro mataram muitos Haitianos. No film voce ve os mortos e como as familias sao deixadas na miseria. 18 brasileiros morreram a toa, porque eles nao apoiaram democracia eles apoiaram o atual corrupto president

    Brails, Canada e o EUA estao com as maos cheias de sangue.

  • 4. à²õ 01:46 AM em 16 jan 2010, sonia maria goes shafa escreveu:

    Realmente o impacto deste terremoto sobre a população Haitiana revela o quanto este povo estava realmente a deriva , mergulhado em lutas políticas, com seus seus serviços básicos de saúde, educação e de infra-estrutura urbana, defesa civil sem equipamentos para atender os danos e evitar mais mortes. desordem social. Num cenário deste o Terremto adquire então danos pavorosos e realmente o que o esforço mundial terá que ser oferecido, poderia ter sido feito antes para e contribuído na melhoria da vida humana. Solidariedade sempre aparece em eventos agudos porque chocam a mente e mexe com os corações. Mas esta situação crônica de desamparo, falta de dignidade em que viviam os Haitianos provavelmente não tem poder de sensibilizar a ajuda internacional por vários motivos de interesses......o que vemos é uma mobilização de ajuda financeira e de voluntários e técnicos também, mobilizando a cidadania mundial e também dos governos que não podem fechar os olhos a esta tragédia.... Na realidade os povos do mundo fazem parte de uma unica sociedade- pena que a política mundial seja obstruída por prorpios interesses. Aqui onde moro estaremos fazendo reunião de Orações pelo povo do Haiti e mobilizei vários amigos para fazerem o mesmo em várias cidade do Brasil- Tem hora que realmente nos tornamos impotentes para conviver com tal sofrimento..e resta-nos pedirmos as graças e Misericórdia de Deus para se espargirem neste país. Sõnia- bahái-Porto Feliz -SP

  • 5. à²õ 09:21 PM em 26 jan 2010, Paulo Albino de Souza escreveu:

    Acredito que o momento não é de "discussão", mas sim de União.Creio que a exemplo do Haiti, muitas outras catástrofes estão por vir, e precisamos entender que o ser humano é efêmero, mas o planeta não, precisamos aprender com os nossos erros, cuidar do planeta e de nossos semelhantes é a única razão de estarmos aqui!!!!!

  • 6. à²õ 10:40 PM em 29 jan 2010, Celso P. Pimenta escreveu:

    A capacidade de mobilização do governo haitiano diante desta tragédia não seria tão pequena se os EUA não tivessem se imiscuído nos assuntos internos do Haiti, desde que depuseram o Presidente Bertrand Aristide.
    De lá para cá, todo o recurso financeiro oriundo dos EUA deixou de ser repassado ao governo legitimamente eleito e passou a ser entregue a ONG's controladas pelos americanos.
    Resultado: na hora que o governo haitiano mais precisava atuar, viu-se sem recursos que deveriam ter sido usados na infra-estrutura governamental, piorando o que já era uma tragédia.
    O mundo seria um lugar bem melhor se os EUA deixassem de se meter nos assuntos internos dos outros países.

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